Tomás Wallenstein, vocalista dos Capitão Fausto, nasceu e cresceu no Campo de Santana, mas adotou e foi adotado por Alvalade, onde desde 2014 ocupa, juntamente com os quatro membros da banda, o primeiro piso de um edifício na Rua do Centro Cultural. É lá que funciona o seu Alvalade particular – porque é este também o nome do estúdio onde costuma passar mais de 9 horas por dia a compor, a tocar e a ensaiar. Foi lá que o músico de 29 anos nos recebeu, entre os acordes secretos do que virá a ser o novo disco da banda, a ser lançado com nove faixas inéditas no último trimestre deste ano. A seguir, Tomás fala sobre a vida, a sua nova empreitada, a emoção de tocar em Alvalade e a rotina no bairro, que considera a sua casa de coração.

Qual foi o contexto em que escrevestes a letra da música “Alvalade Chama Por Mim”, uma das faixas do álbum Capitão Fausto Têm os Dias Contados, de 2016?
Era uma altura em que estávamos todos a fazer projetos para o
futuro, que é a tónica de todo o disco. Aquele momento de transição, de
estarmos a acabar os cursos da faculdade, de estarmos a fazer planos e a
imaginar coisas… Um momento de expectativa, de ponderação e de
descoberta de uma nova fase.
E qual é o significado do bairro neste contexto?
Alvalade está ali a simbolizar o sítio onde é pretendido
chegar: a nossa casa, que é o que o estúdio representa para nós.
Passamos muito tempo aqui, às vezes chegamos a dormir aqui, construímos
tudo isto à mão.
Afinal por que é que ainda não vives de fato em Alvalade?
Porque não encontrei casa! Eu, o Domingos (baixo) e o Salvador
(baterista) moramos juntos na Morais Soares, na Praça do Chile. Não é
longe de Alvalade…
O que Alvalade tem de mais especial?
É um sítio que não sofreu as transformações que a maior parte
da cidade sofreu. Antigamente o comércio era feito na rua; e as ruas
eram feitas de comércio. Entretanto a maior parte do comércio de rua na
cidade desapareceu e aqui continua-se a fazer a pé o circuito do talho,
da frutaria, da loja de ferragens, da loja de computadores, da loja de
impressões, do supermercado. Fazemos tudo aqui no bairro! Quando
perdemos uma chave vamos sempre à mesma senhora fazer cópia, quando
queremos um gelado vamos à Conchanata…
Qual é o roteiro dos Capitão Fausto pelo bairro?
Para o almoço vamos à Adega Verde Lima, onde trabalha o nosso
amigo David e se come muito barato e bem. A alheira é ótima, também o
lombo assado no forno. O Solar Minhoto tem o melhor bitoque de Lisboa!
Às vezes vamos ao Sem Palavras, ao Tico-Tico e ao Petisco de Alvalade,
do Sr. Carlos. Na Casa Al Parma trabalham as pessoas mais amorosas do
mundo! E o Pasta Non Basta é muito bom. Na Conchanata é preciso comer a
conchanata, com gelado de nata e calda de morango.
Deram um concerto recentemente no Parque do Campo Grande. Tocar em Alvalade tem um sabor especial?
É como tocar em casa. Alvalade (o estúdio) está a tornar-se o
sítio onde tocamos mais horas na história dos Capitão Fausto – e nunca
havíamos feito um concerto em Alvalade (o bairro). O fim dos concertos
geralmente está associado a grandes viagens, a arrumar coisas… e neste
caso fomos a pé!
O que se pode esperar do novo álbum – A Invenção do Da Claro – a ser lançado ainda este ano?
O fato de termos ido gravar ao Brasil mudou um bocadinho a
nossa atitude em relação ao disco. Ficamos muito contentes com a
experiência, que foi inacreditável. Quisemos de uma maneira inocente
deixar-nos contagiar por algumas coisas que são do Brasil, alguns
instrumentos. Fomos todos a imaginar o que poderíamos trazer para nós
daquele universo do samba, do choro, da bossa nova e dos grandes
autores, da lírica muito rica… sem que deixasse de ser um disco muito
nosso. Se há coisa que já podemos dizer é que há nuances de ritmos
brasileiros. Teve cavaco, pandeiro…